Não tenhamos dúvidas: eu, cidadã do Estado Português, nunca me vi envolvida em nenhuma situação de violência doméstica; eu, nascida na Ilha da Madeira, tive acesso à educação e à possibilidade de me tornar uma cidadã com participação activa. Contudo, não é a partir do meu exemplo que pauto todos os outros. Sei, porque vejo adolescentes que continuam a ser educadas para o universo do lar, adestradas para a obediência e para poucas ambições fora desse plano. Sei, porque ouço adolescentes que continuam a referir-se às primeiras namoradas como propriedade, e os planos futuros construirem-se sobre uma ideia de um casamento que lhes traga uma mulher que lhes faça a comida. Sei, porque lhes ouço os comentários sobre como o ciúme é uma prova de amor, de preocupação, de carinho. E preocupa-me que digamos que agora está tudo bem - preocupa-me que alguém com responsabilidades acrescidas, como o Bastonário da Ordem dos Advogados, considere pertinente retrocedermos no que foi conseguido ao longo deste tempo e evoque - de forma mais polida, é certo - o velho ditado que entre marido e mulher ninguém deve meter a colher. E temos os dezassete óbitos destes primeiros meses de 2008 a confirmar a justeza de um retrocesso da natureza que o senhor evoca.
*A expressão é da autoria da Isabela, de O Mundo Perfeito.
Elisa Seixas